O que pensa quem busca tratamento para depressão?
Se a depressão é marcada por certos pensamentos e sentimentos ele espera que o tratamento altere esses pensamentos ou sentimentos? Ele pergunta se algumas atitudes que vinha tomando contribuíram para colocá-lo nesse estado?
Tratar a depressão com medicamentos e atribuir apenas a um “desequilíbrio químico” o responsável por seu estado se tornaram tão comuns que essas perguntas deixaram de ser formuladas pela maioria das pessoas.
Todos conhecem ao menos uma pessoa que tomou medicamento antidepressivo e mudou de maneira evidente. Quantos conseguem contar a história de alguém que superou a depressão por ter amadurecido, percebido atitudes erradas e passado a enxergar o mundo de uma nova maneira?
Quando isso ocorre, o poder que cada indivíduo teria de mudar a própria vida é reduzido. Se não mais questionam as próprias escolhas, crenças, valores e hábitos, resta questionar qual novo medicamento irá trazer alívio ao seu sofrimento. Nesse ritmo, a ciência evolui e o indivíduo encolhe. Se o indivíduo não se questiona e não aprende algo, pode-se chegar a um ponto em que qualquer medicação não fará mais efeito. Medicamentos podem ser essenciais em casos mais severos de depressão, mas se não for dada atenção ao que a pessoa pensa, mesmo o medicamento mais potente irá trazer melhora apenas temporária.
Não há resposta única e solução rápida que faça com que magicamente qualquer pessoa com depressão conquiste um pouco mais de força e amadurecimento, mas um ponto inicial é avaliar o que psicólogos chamam de “atitude de regulação emocional”, algo que pode ser feito, por exemplo, simplesmente respondendo a um questionário que foi desenvolvido por duas professoras da Universidade de Leiden, na Holanda, o questionário de regulação emocional conhecido pela sigla CERQ.
Responda ao CERQ e avalie se sua atitude diante de perdas ou frustrações é protetora ou promotora de episódios futuros de depressão
CERQ – Questionário deregulação emocional
No modelo de tratamento da estimulação magnética transcraniana, uma modalidade potente de tratamento biológico indicada para casos resistentes a medicamentos, há também uma oportunidade de voltar a fazer com que o indivíduo valorize o papel dos próprios pensamentos, transformando em aprendizado parte da melhora obtida por meios biológicos.
Isso exige aproveitar a sequência de 20 visitas que o paciente faz em 1 mês para educá-lo sobre a importância de questionar hábitos, visões e valores para evitar a recorrência da depressão. A simples resposta ao CERQ já funciona como uma sessão educativa.
Já no modelo de tratamento com medicamentos, leva-se 1 segundo para ingerir uma cápsula que irá agir de maneira estável ao longo das 24 horas de cada dia, mas que só irá refletir na maneira como a pessoa reage a emoções após 4 a 8 semanas, pois o efeito surge apenas quando níveis de neurotransmissores persistentemente alterados induzem uma mudança de sensibilidade nas sinapses que servem como ponte para comunicar emoções à consciência.
Se o paciente não converte em aprendizado uma parte dessa melhora, a comodidade de apenas ingerir um comprimido e a mágica de sua lenta instalação podem fazer com que se valorize apenas o medicamento e se despreze o papel que algumas atitudes tiveram em levá-lo àquele estado.
É como lançar uma pá de terra sobre a depressão que germinou mas deixar que ela continue criando raízes para voltar com mais força por baixo dessa camada.
“Quem melhora da depressão com algum tratamento biológico e não converte ao menos parte dessa melhora em aprendizado, corre o risco de se tornar, no futuro, mais frágil e mais resistente a tratamentos biológicos.”
E mesmo que os sintomas fiquem sob controle, quando o medicamento é retirado, os níveis de sensibilidade voltam ao estado anterior. Se o paciente não aprendeu nada, os sintomas irão voltar.
O tratamento com EMT, da mesma maneira que medicamentos, é um método biológico e não exige nenhum tipo de abordagem psicológica combinada. Nos estudos que demonstraram a eficácia da Estimulação Magnética para depressão não foi dada qualquer orientação de pensamento ou atividade ao paciente, portanto, para obter o mesmo grau de sucesso que esses estudos obtiveram, não é necessário se preocupar com isso.
Mas isso não significa que a abordagem psicológica não seja importante. E apenas lembrar ao paciente o quanto isso é importante já vale a mensagem.
Isso não quer dizer que seja fácil encontrar respostas. Muitas vezes o maior desafio é encontrar ainda as perguntas corretas. Se o paciente desistir de se questionar, encontrar as perguntas corretas e suas respostas será impossível.
Edrin Vicente, neurologia clínica
Serviço GET-EMT Vila Mariana, São Paulo, SP
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