Em outro texto, que se encontra nesse link, eu apresento justificativas e referências para combinar o exercício de atenção de Wells com sessões de Estimulação Magnética Transcraniana. Nessa página o objetivo é dar instruções detalhadas para realizá-lo.

Sua atenção está mais no “interno” ou “externo”?

Antes de fazer o exercício, observe o quanto sua atenção é atraída,nesse momento, a pensamentos, lembranças e ideias (o seu mundo interno) e o quanto é atraída ao que está diante dos seus olhos e sentidos (o mundo externo no momento presente, com todas suas cores, cheiros, sons e sensações corporais do “agora”)

Escala de atenção de Wells

Na maior parte do tempo, deixamos nossa atenção constantemente dividida entre o mundo exterior e o mundo interior e ela flutua automaticamente entre um e outro à medida em que coisas ou pensamentos chamam nossa atenção, despertam nosso interesse.

  • Anote o escore que você atribui, nesse momento, ao seu grau de introversão e extroversão usando a escala de atenção de Wells ilustrada na figura acima, onde -3 corresponde a atenção totalmente focada no momento presente e ambiente externo aos pensamentos e +3 corresponde a atenção totalmente presa ao mundo interno de pensamentos, preocupações, ideias, planos ou lembranças.

As orientações para esse experimento ou exercício de Wells são bastante parecidas com orientações de uma sessão de meditação, mas note que o objetivo não é produzir nenhuma sensação especial que alguns podem querer chamar de sensação mística, o objetivo não é também produzir relaxamento.

O objetivo inicial é mostrar como você pode condicionar sua atenção e como esse condicionamento da atenção permite perceber de maneira diferente os pensamentos e impulsos que surgem diante da sua consciência, de uma maneira que te dará mais controle.

“Dirigir a atenção” é uma função cognitiva que pode ser condicionada e reforçada de uma maneira análoga a condicionamento físico. E assim como, após exercício físico você se sente mais forte, você perceberá que com esse exercício mental será mais fácil dirigir sua atenção a algo. Ao recrutar completamente a faculdade mental de dirigir a atenção você deve sentir maior poder de auto-controle.

Pode-se até usar o termo “sedentarismo” a quem não exercita essa faculdade mental, e, de uma certa maneira, considerar o estado psíquico que caracteriza a depressão como uma consequência do sedentarismo da atenção. Se não exercitamos o controle voluntário da atenção, a tendência é que ela seja conduzida automaticamente por emoções, quer sejam produzidas em nosso mundo interno ou em estímulos do mundo externo. Dirigir voluntariamente a atenção alimenta a formação de novos interesses. Deixar a atenção ser conduzida leva a um estado de automatismo que pode ser classificado como “alienante”.

  • Escolha um lugar para o exercício de onde possa identificar 5 sons diferentes

Vá a uma sala com janelas abertas para o exterior a partir de onde possa identificar uma série de sons diferentes e identifique ao menos 5 sons, 3 sons mais frequentes e 2 sons mais raros, e procure usar tanto sons de fontes próximas (como um relógio mecânico ou uma fonte de água na sua sala ou sons de salas ou apartamentos vizinhos como sons à média distância (do trânsito – aceleração, freios, buzinas – pássaros) e a grande distância (como aviões passando, sirenes à distância).

Durante todo o exercício mantenha o olha fixo em algum ponto à sua frente e tenha um cronômetro ou relógio à vista, para controlar o tempo de cada fase do exercício. O experimento dura apenas 12 minutos.

Toda sua atenção deverá ser dirigida apenas a sons durante o exercício. Você deverá perceber que até mesmo o que entende por “dirigir a atenção” deve evoluir com a prática. Quem dedica esforço ao exercício conta que se percebe, depois, usando recursos mentais que, no início, não estava usando ao dirigir atenção a algo.

  • Nos primeiros 5 minutos, concentre toda sua atenção de maneira prolongada, por 1 minuto, a cada 1 dos 5 sons.

Nos primeiros 5 minutos do teste você irá desviar repetidamente toda a sua atenção a apenas 1 som por vez e manter toda atenção nesse som por 1 minuto continuamente. Digamos que você comece dirigindo a atenção ao som de um eletrodoméstico, uma geladeira, que produz um leve zunido constante.

Certamente, durante esse minuto, sua atenção será desviada do zunido por algum outro som. Quando isso ocorrer basta voltar a atenção ao zunido da geladeira. Se sua atenção for desviada várias vezes, basta voltar várias vezes a atenção. Além de outros sons, sua atenção será desviada também por pensamentos. Você terá tempo para dedicar aos pensamentos, caso queira, após o exercício, mas durante o exercício qualquer pensamento que lhe ocorra você deve tratar como outro ruído: foi algo que o distraiu. Basta voltar a atenção ao som.

Se mesmo após voltar a atenção ao som do zunido o pensamento volta, não tente inibir o pensamento, basta voltar repetidamente a atenção ao som. Nosso cérebro não entende o comando “não posso pensar nisso”, que acabaria tendo efeito de chamar ainda mais atenção a isso. Se sua atenção for desviada por um pensamento, basta desviar de volta ao som. O exercício requer esforço. O tempo todo você terá que redirigir sua atenção ao som. Não há maneira errada ou certa de dirigir a atenção aos sons. O importante é você persistir no esforço. À medida que você vai repetindo o esforço de dirigir a atenção até aquilo que você entende por “dirigir a atenção” pode mudar, como já mencionei.

Depois de 1 minuto voltando toda atenção ao primeiro som, passe agora a um segundo som: a sons de veículos se movendo no trânsito, por exemplo, e repita o esforço de dirigir a atenção a esse segundo som a cada vez em que se distrair. Após 5 minutos você terá dedicado atenção prolongada a 5 sons diferentes.

  • Nos próximos 5 minutos se deve exercitar a mudança rápida de atenção. A cada 10 segundos mude o foco da atenção

Agora começa a fase do exercício em que o esforço será mudar rapidamente o objeto de atenção. Começe dirigindo toda atenção ao primeiro som da sua lista e, a cada 10 segundos, mude o foco da atenção para o som seguinte e continue mudando a cada 10 segundos até completar mais 5 minutos. Dessa maneira você terá mudado 30 vezes o objeto da atenção em 5 minutos. É importante que você tenha um cronômetro à vista para que não abrevie essa parte do exercício.

  • Nos últimos 2 minutos será exercitada a atenção dividida

Por fim, nos últimos 2 minutos, tente distribuir sua atenção simultaneamente a todos sons da sua lista.

Ao término desses 2 minutos tente listar mentalmente todo tipo de som que ouviu, procurando identificar o que provocou cada som.

Ao fim do exercício procure novamente identificar onde está sua atenção no eixo “Mundo externo”, “Mundo interno”.

Se o exercício foi feito com esforço, você deve perceber que a atenção a sons condicionou sua mente a ter a atenção desviada a sons mesmo quando você já não está mais fazendo esforço. Sons que antes não seriam registrados pela sua consciência agora lhe chamam a atenção espontaneamente. Talvez isso lhe provoque uma sensação de novidade, mas qualquer sensação que tenha não é importante. O objetivo do exercício não deve ser “provocar sensações”.

Talvez você tenha feito o exercício alimentando dúvida em relação a sua eficácia. A preocupação é razoável. Mas note que você pode, e deve, questionar a validade do exercício, tanto antes como após o exercício, mas não durante os 12 minutos de sua duração, pois questionar a validade recruta e divide sua atenção. Se, durante o exercício lhe surgiu um pensamento questionando sua validade, não iniba o pensamento mas não o persiga, reconheça que teve o pensamento e se esforce para voltar a atenção a sons.

Com a prática, você passará a perceber o que há de automático e condicionado nos pensamentos que surgem em sua mente. Ao perceber esse aspecto, os pensamentos perdem parte do poder de nos impelir a agir e você perceberá maior capacidade de controle. Pensamentos que vinham com um “imperativo emocional” agora perdem sua autoridade perante nossa consciência.

O aprendizado com o exercício de atenção, no entanto, não é linear. Talvez, após um progresso inicial, você passe por fases em que o exercício parece ter menos efeito na redução da introversão. É preciso sempre se questionar para não voltar a cair em armadilhas mentais, em ilusões.

Levando em conta o aspecto de aprendizado, eu acho até que um nome mais adequado do que “exercício de atenção de Wells” seria “curso de atenção de Wells” ou “treinamento de atenção de Wells”. Se a pessoa percebeu o papel que a atenção ao ambiente interno exerce no seu estado de humor e como o direcionamento da atenção permite obter auto-controle, ela aprende depois outras maneiras de dirigir a atenção ao momento presente, ao ambiente externo, e não há necessidade de ficar repetindo o exercício o resto da vida.

As mesmas ideias que esse exercício transmite podem ser formuladasde forma muito mais sofisticada na linguagem filosófica ou na linguagem de quem se especializa em técnicas de meditação. Eu recomendo, particularmente, esse livro “A quietude é a chave”, em que o autor aborda também ideias similares com base na filosofia estóica e esse livro “Despertar”, em que um neurocientista fala de técnicas de meditação.

Edrin Vicente, neurologia clínicaResponsável pelo serviço GET-EMT Vila Mariana, em São Paulo